(CRÔNICAS
ANACRÔNICAS)
http://licburlesco.blogspot.com/2013/10/cronica-nome-de-via-publica.html
Parecia manchete de
jornal (“AMOR E TRAIÇÃO NAS RUAS DE SÃO
PAULO”), e chamava minha atenção porque o remetente do e-mail era um sisudo amigo,
que jamais imaginaria interessar-se por notícia
policialesca de jornal.
O texto falava sobre personagens que viveram uma história dramática e que deram seus nomes a conhecidas ruas de São Paulo: “As ruas Dona Veridiana, Major Sertório, Maria Antônia e Avenida Angélica são próximas na cidade, e o foram na vida".
Dona Veridiana Prado, rica filha de fazendeiro do café, casou-se com o Major
Sertório, com quem teve filhos, dentre eles, Angélica”, cujo maior mérito foi
ter sido morta pela Maria Antônia. Angélica foi vítima acidental no imbróglio entre as duas mulheres,
na disputa pelo Major Sertório, que também não deveria ser grande coisa... .
Tenho curiosidade sobre as origens dos nomes de vias públicas, e em particular, em relação à origem do nome Avenida Angélica, em uma crônica de 2001, perguntava
quem teria sido a Angélica que deu seu nome a uma importante Avenida no bairro da Consolação.
Se
a história contada no e-mail é verdadeira, talvez o meu amigo sisudo estivesse
contestando o fato de se dar nomes a vias públicas homenageando personagens envolvidos
em um caso passional, que deve ter escandalizado a sociedade da época. E apenas por isso.
A
Crônica – “Nome de Via Pública” faz uma
reflexão sobre a importância histórica e cultural dos nomes das
Vias Públicas.
NOME DE VIA
PÚBLICA – (José Nagado)
Rua Angaturama. Meu
dicionário diz que Angaturama significa “Espírito protetor”, entre os índios
Muras. Gostei. Diria que é até poético um nome indígena.
Muitas vias públicas possuem
nomes encantadores como as ruas do bairro de Moema, batizadas com nomes de
pássaros da fauna brasileira, tais como Periquito, Graúna, Rouxinol, Pavão,
Cotovia, Sabiá, e outros.
Outras vias públicas têm um
apelo cosmopolita, possuindo nomes de Países como Irlanda, Itália, Áustria,
Suécia, França e México, existentes no bairro de Pinheiros.
Para lembrar a origem dos moradores da Capital, no Jardim Paulista e Bela Vista ruas possuem nomes de cidades do estado de São Paulo, como Santos, Itu, Franca, Campinas e Ribeirão Preto.
Da Avenida Paulista, não é
necessário se dizer nada, ou, como já foi dito por alguém, é a mais Paulista
das ruas, amada por todos os paulistanos.
Não sei quem teria dado tais
nomes a essas vias públicas. Ninguém pode ter nada contra esses nomes e muitos
outros que seriam aprovados com unanimidade pela população. Não é o que
acontece com algumas vias públicas, que homenageiam políticos desonestos e até
seus parentes. É o trabalho de vereador puxa-saco ou sem competência para
elaborar propostas mais importantes.Propor nomes de ruas, já faz parte do
anedotário da Câmara, onde diversos edis não fazem outra coisa.
Falando ainda de nomes de
vias públicas característicos de alguns bairros de São Paulo, não se poderia
deixar de lembrar das Ruas do Bairro do Ipiranga, um festival de nomes
históricos ligados à Independência do Brasil, como por exemplo, Brigadeiro
Galvão, Lucas Obes, Almirante Lobo, General Lécor, Labatut, Lima e Silva, e
muitos outros.
Um desses, Lorde Cochrane,
foi distinguido pelo seu aspecto infame, no rescaldo dos comentários sobre as
comemorações dos Quinhentos Anos do Brasil.
“Onde havia um herói surge
apenas um mercenário”, publicou o jornal O Estado de São Paulo, em um dos seus
números do mês de janeiro deste ano. Curioso, fui procurar a história desse
Lorde. Pelo que sabemos, no Brasil não existe oficialmente esse título. Na
realidade, o homenageado foi um mercenário (entre tantos) britânico, que havia
sido expulso da Marinha Britânica e do Parlamento Britânico, onde os membros da
Câmara Alta tinham o título de Lorde. Conta a história, que o motivo da
expulsão foi fraude.
De acordo com a enciclopédia
Barsa, a convite do General San Martin, herói nacional da Argentina, Cochrane
veio para a América do Sul onde participou, antes de vir ao Brasil, de algumas
batalhas e ficou conhecido por “seu espírito interesseiro e mesquinho, ao fazer
algumas presas com intuito exclusivo de lucro desonesto”.
Contratado por D.Pedro I,
participou da nossa Guerra da Independência como Almirante, comandando uma
esquadra Britânica contra tropas leais à
Coroa Portuguesa. Deixou o país em 1825, sem licença, para nunca mais
retornar.
Mercenário, porém herói
Nacional? Mercenário como o Comandante Taylor e Greenfell, também nomes de ruas
do bairro do Ipiranga, Cochrane apenas fazia parte do “auxílio militar” com que
a Coroa Britânica buscava as vantagens que a sua “colônia” lhe proporcionaria,
garantindo-lhe em contrapartida a independência política e econômica de
Portugal.
Duas considerações podem ser
feitas sobre Cochrane:
- Considerando-se sua
participação na história brasileira, seria mais correto denominar a rua com o
título de Almirante e não de Lorde. Almirante Cochrane, como são denominadas,
em São Bernardo do Campo e Diadema, as ruas que lembram esse inglês.
- Considerando-se a mancha
histórica no aspecto moral e cultural que os escusos interesses da Coroa
Britânica produziram ao Brasil, não seria mais correto atribuir a Cochrane (e
demais mercenários) o devido valor, coisa já feita ao pé da letra, em libras
esterlinas, retirando-lhe a malfadada homenagem ao militar mercenário e
substituindo-a por uma alusão histórica ao fato ou objetivo conquistado?
Nunca soube quem
teria sido o “notável homem” que cedeu seu nome à rua onde morei durante alguns
anos.Também nunca procurei saber. Era um nome comum, sem qualquer título que
pudesse indicar a atividade ou o mérito do homenageado. Pode ter sido cometido
uma grande injustiça ao se negar-lhe um título. Assim como ocorreu com a
Avenida Angélica, cujo nome, acredito, deve homenagear a sóror Joana Angélica,
mártir pouco conhecida da nossa independência. Sóror Angélica já estaria de bom
tamanho. Se não for essa Angélica, quem teria sido homenageado?
Valeria a pena mudar nomes de vias públicas? No caso do Cochrane, diria que sim e historiadores sérios poderiam opinar. A opinião pública também poderia ser ouvida em muitos outros casos.
JN – 07/02/01
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