Cassio Carvalheiro

terça-feira, 26 de novembro de 2013

CRÔNICA - O BAR DO LUIZ

 

 

JOSÉ NAGADO

(CRÕNICAS ANACRÕNICAS)

A quem poderia interessar uma crônica que fala de um barzinho na Avenida do Cursino? Em lugar desta crônica, pensei em postar uma outra crônica sobre um colega do Colégio, que se tornou diretor de filmes pornôs.  Quem sabe ainda consiga contatar esse antigo colega e com a permissão dele, postaria a tal crônica: "Em Cartaz". 

Muita gente frequentou o Bar do Luiz e muita gente ainda conhece e talvez frequente o lugar. Cinco pessoas foram citadas na crônica, não nominalmente. Duas delas já são falecidas, o que torna a Crônica ainda mais anacrônica. 

Um dia  ainda voltarei ao Bar do Luiz com os amigos sessentões de agora. 

José Nagado (26.11.2013)


 

O BAR DO LUIS

http://licburlesco.blogspot.com/2013/11/cronica-o-bar-do-luiz.html

   Fica na Avenida do Cursino, tem uma porta de aço de enrolar, um balcão para servir aquele cafezinho horrível e a cachaça do alcoólatra apressado, seguido da geladeira que se estende até o fundo do bar, onde fica a caixa registradora, invariavelmente o posto do dono do bar, da esposa ou de um dos filhos. Ao longo do balcão e na calçada, algumas mesinhas e cadeiras de aço, com a propaganda de uma marca de cerveja.

   Falo do Bar do Luis. Desde 1962, como diz o luminoso sobre a porta do bar, também com a propaganda da mesma cerveja divulgada nas mesas e cadeiras, que um amigo que morava ali perto vivia dizendo que eu tinha que ir lá um dia, para provar o bolinho de bacalhau, junto com uma cervejinha super gelada, além de outros quitutes que eram de dar água na boca.

   Logo que mudei para um bairro próximo da Avenida do Cursino, voltando certa tarde do trabalho com esse amigo, resolvemos ir ao Bar do Luiz. O bar estava cheio de gente que voltava do trabalho como nós, alguns ainda engravatados e outros mais à vontade, parecendo que já tinham passado nas suas casas e saído só para dar aquela chegada no bar do Luiz, para a cervejinha de fim de tarde.

   Passando pela fileira de mesinhas dentro do bar, fui direto ao banheiro que avistei logo que cheguei, desesperado para tirar a água do joelho. Ã frente de um monte de caixas com garrafas de bebidas e outras coisas amontoadas, ficava a porta do banheiro, mal iluminado e sujo, como era de se esperar. Aliviado, sai do banheiro e passei pelo Luis (devia ser ele), que  embora ocupado, me cumprimentou com um boa noite e fez a propaganda dos salgadinhos sobre o balcão: “Estão fresquinhos. Saíram agora. Delícia”.

   Bolinhos de bacalhau, esfihas, quibes, salsichas boiando em um molho avermelhado, ovos cozidos, pizza cortada em pedaços, sardinhas fritas e aquela duvidosa pururuca de leitão estavam ali, dentro do conservador de alimentos quentes ou espalhados sobre o balcão.

  Meu amigo já tinha ocupado uma mesinha na calçada e estava acabando de fazer um pedido para o garção: “...dois copos, e pra começar, pode trazer meia dúzia daqueles bolinhos de bacalhau que o amigo ( eu, chegando) aqui vai degustar”.

   Realmente o bolinho de bacalhau era bom, mas nada de especial. A cerveja era tomada naqueles copos tipo americano, de vidro, que a iluminação fraca das mesas não permitia ver se estavam bem lavados. Nada disso tinha importância para o pessoal que estava no bar, numa conversa  animada e com certeza ficariam por ali até bem tarde. Bem tarde, para os freqüentadores desses antigos bares de fim de expediente, significava dez ou onze horas da noite, quando muito. O que todos queriam, na verdade, era curtir o fim do dia por uma ou duas horas batendo um papo e tomando aquela cervejinha gelada e comendo os bolinhos do bar do Luiz. A excelência desses bolinhos era a justificativa (exagerada) dos seus frequentadores, para dar a parada de toda tarde nesse ponto.

   Uns dez anos atrás, com três amigos fui fazer doação de sangue em nome de um parente de um deles. Era sábado, pela manhã, e no retorno do Banco de Sangue, após alguém elogiar os fabulosos bolinhos do Bar do Luis, resolvemos parar ali para tomar aperitivo e comer os tais bolinhos. Tudo continuava como dantes, só que mais envelhecido. Não sei se o Luiz continuava lá. Os freqüentadores pareciam aqueles mesmos trabalhadores que por lá passavam nos fins de tarde, dez anos antes.

   Minha lembrança desse dia não foi muito agradável. A doação de sangue fez a minha pressão arterial abaixar e uma batida de abacaxi acabou de fazer o resto. Tive uma queda violenta da minha pressão que um dos amigos logo resolveu com uma providencial pressão na minha nuca, enquanto eu fazia um esforço para levantar o corpo para a posição vertical. Terminei meu aperitivo tomando um refrigerante, sem bolinho, e sendo gozado pelos três amigos.

   Recentemente, passando pelo local a pé pela manhã, num dia no meio da semana, tive a curiosidade de ver como estaria o Bar do Luiz. Estava fechado. Nunca imaginara que esse bar não abria desde cedo. Talvez, pensei, sempre fora assim, um bar dedicado a honestos trabalhadores, assíduos freqüentadores de fins de tarde. Não era, pelo que passei a perceber, daqueles botecos onde a corja de vagabundos e alcoólatras começa a se reunir desde cedo, para passar o tempo jogando loto ou cartas, ou dirigindo gracejos às mulheres que passam pela calçada.

   Uma lei municipal, decretada há pouco tempo, restringiu a abertura de bares até a uma hora da madrugada, visando garantir a tranqüilidade da vizinhança. Boa lei, que se for respeitada, também contribuirá para a redução de crimes e violências praticadas por gente desqualificada que adentra muitos bares desse tipo nas violentas madrugadas de São Paulo.     

   Não é o caso do bar do Luiz, que fecha cedo e é amado por gente trabalhadora, como um amigo que tinha lá a sua cadeira cativa até pouco tempo antes de morrer. Para ele, o Bar do Bolinho, ou melhor, o bolinho do Bar do Luiz é o melhor que há. 
Acho que é verdade.


José Nagado – 19/08/01



 

 






2 comentários:

  1. Nagado, faz umas quatro horas eu pensei que tinha postado um comentário, mas voltei a entrar no blog e vi que não foi publicado. Coisas da internet...

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    1. Luiz Roberto, boteco sempre foi local para conversas descontraídas, e
      foi naquelas mesas do Bar do Luiz que rabisquei ensaios sérios sobre alguns temas escatológicos, ainda não abordados no Burlesco. Espero que
      seu comentário não tenha sido censurado...

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