Cassio Carvalheiro

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

CRÔNICA - DEFENESTRADOS (07.03.2001)

Brasileiros,   


Esta crônica de (07.03.2001), lembra o episódio recente (1992) na história do Brasil, que foi o Impeachment do Presidente Collor, primeiro Presidente eleito (1989) pelo voto direto, após o regime militar (1964-1984). 
Em março de 1983, o deputado Dante de Oliveira apresentou ao Congresso Nacional uma proposta de emenda à Constituição pleiteando o restabelecimento de eleições diretas para Presidência da República, que em 1984 resultou no movimento pelas DIRETAS JÁ ! 
Após as eleições (indiretas) de 1985, tendo morrido Tancredo Neves o vencedor dessa eleição, José Sarney tomou posse como vice de Tancredo. 
Fui na despedida do féretro de Tancredo Neves, quando partiu do aeroporto de Congonhas, numa triste manhã de sábado...
Junto com os colegas de trabalho na CESP, fomos em duas grandes manifestações em São Paulo, pelas DIRETAS JÁ. Tínhamos esperança no Brasil... 



DEFENESTRADOS


Em 1890, o “Grande” Rui Barbosa mandou queimar os documentos relativos à escravidão. (charge de Ângelo Agostini, na Revista Ilustrada)

Vi a charge com o texto acima, em “A História Crítica da Nação Brasileira” de Renato Mocellin - Editora do Brasil-1987, no capítulo que trata da decadência e fim do Império, onde é dada alguma importância ao fim da escravidão no Brasil (1888) e nenhuma importância a Ruy Barbosa, nessa questão da Escravidão.

A palavra Grande entre aspas, no texto, deu-me a impressão que o autor quis ironizar Ruy Barbosa, que aparece sendo questionado por um personagem vestido de bobo da corte abanando uma fogueira de documentos.

Em “Ruy – o Estadista da República”, da Livraria Martins Editora – 3a. Edição, João Mangabeira afirma que “Na campanha pelos escravos, não é Ruy a figura primacial. Nem, tampouco, Nabuco ou Patrocínio. Foram todos precedidos e excedidos pelo clarão sideral de Castro Alves”. O Brasil começava a respirar os ares da Primeira República e Ruy aparecia com grande destaque já no governo provisório formado após a proclamação da República em novembro de 1889, quando, ao que parece, tentou mostrar a aversão e vergonha ao período de escravidão que a República pretendia apagar.

Cem anos após, em 1990, Collor, o primeiro Presidente a ser eleito pelo voto direto pelos brasileiros após o regime militar (1964-1984), decidiu queimar os documentos da biblioteca do SNI – Serviço Nacional de Informações. Criado por Castelo Branco no primeiro governo do regime militar, essa biblioteca abrigava informações secretas e dossiês completos de muita gente que o esquema de repressão do governo militar reprovava ou desconfiava.

Oficialmente, a queima dos arquivos do SNI buscava completar a distensão política que o primeiro governo da Nova República, do presidente Sarney (1985-1989), não conseguira conquistar. De passagem, não tenho dúvidas de que Collor queria assinalar o início do seu governo com o gesto de um grande estadista, como Ruy. Comparação infeliz.

Antes de falar do Collor, é preciso falar do Presidente Sarney. Sem entrar nos meandros da sua história política, pode-se dizer que Sarney foi preterido pelo seu partido, o PDS, que decidiu apoiar o nome de Maluf para as eleições indiretas de 1985. Sarney, um dos fundadores do PDS foi seu presidente até 1984, quando renunciou e entrou no PMDB, o partido de Tancredo Neves, que acabou eleito pelo Congresso Nacional em janeiro de 1985, graças a Aliança Democrática, composta pelo próprio PMDB e pela Frente Liberal. E Sarney era o vice de Tancredo, que como todos sabem, morreu antes de tomar posse como Presidente da República.

Defenestrado pelo PDS, sucessor do antigo partido do governo, a ARENA, Sarney chega a presidência da República pelo PMDB, partido fundado pelos antigos opositores ao Governo, o MDB.

Collor tinha sua vida política ligada ao Estado de Alagoas, onde fora prefeito biônico de Maceió, deputado federal e também governador desse estado nordestino, de onde veio com a fama de caçador de marajás, por ter feito o saneamento dos serviços públicos do estado. Pelo menos era aquilo que a mídia controlada por ele e sua família apregoava.

Apoiado por um partido sem expressão, o PRN - Partido da Renovação Nacional, Collor colocou-se perante os eleitores, nas eleições presidenciais de 1989, como um marco entre o Brasil das velhas siglas e vícios arraigados e um Brasil moderno, com soluções para os crônicos problemas políticos, econômicos e sociais do país. Oitenta e três milhões de eleitores, incluindo analfabetos e maiores de 16 anos. Um eleitorado constituído em sua maior parte por jovens de menos de 30 anos, renda inferior a dois salários mínimos e 68% sem ter concluído o primeiro grau, acabou dando a vitória a Collor, que venceu ao seu opositor Luis Inácio da Silva, o Lula, no segundo turno das eleições. Foram trinta e cinco milhões de votos em todo o Brasil, tendo recebido a maior votação inclusive na cidade de São Paulo, capital do Estado onde Lula tinha suas bases eleitorais.

Foram 930 dias da era Collor, que acabaram no seu “impeachment” como presidente, resultante do movimento de milhões de brasileiros descontentes com os desacertos políticos e socioeconômicos, e principalmente com as irregularidades no seu governo, marcado pela corrupção. Isto em Setembro de 1992.

Defenestrado do governo, cassado seus direitos políticos, Collor curtiu seu desterro de 7 anos no exterior, com a elegância e conforto que só muito dinheiro poderia pagar, e voltou ao Brasil a tempo de se candidatar à prefeitura de São Paulo, nas eleições do ano passado. Conseguiu uma legenda de aluguel, já que o PRN também o tinha defenestrado.

Foi defenestrado mais uma vez, desta feita, da política.


JN – 07/03/01



 










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