Cassio Carvalheiro

quinta-feira, 11 de junho de 2015

CRÕNICA - O PALCO DAS RUAS e seus Personagens (jn.30.05.2001)

CRÕNICA - O PALCO DAS RUAS e seus Personagens


O brasileiro sofre, desesperado, com o atual Ajuste Fiscal promovido pela segunda edição do governo Dilma,  governo que promete ser ainda mais grotesco do que o anterior. No primeiro governo, Dilma iniciou inúmeras obras (do PAC) que não foram executadas, por falta de planejamento ou por falta de dinheiro. Certo: Falta de competência. Na campanha eleitoral (2014) fez promessas que não poderiam ser cumpridas. Certíssimo: falta de bom senso.
Agora, com o Brasil endividado, faz alarde de gastos de milhões em obras de infraestrutura, muitas das quais já deveriam ter sido executadas no governo anterior, clamando por investidores que  certamente estarão sedentos de propostas indecentes de um Governo eivado pela corrupção e inchado pelo clientelismo. Pergunta: Existe planejamento  (sério) do governo para execução dessas obras?
A Dilma e o PRESIDENTE  dos EUA farão reunião bilateral no plano da Cúpula das Américas, dia 30 de junho  próximo, com uma agenda altamente técnica contrastando com os temas discutidos no Brasil, onde ocorrem enfáticas discussões sobre o direito de união entre humanos e animais, além de outros direitos esdrúxulos pleiteados por políticos petistas. Não bastassem os escândalos de corrupção na Petrobrás, BNDES, etc. e agora, com o nosso maior dirigente do futebol, preso na suíça e requisitado para extradição pela justiça americana, certamente o Presidente Americano terá que ter muito controle para não dar gargalhadas ao ver diante dele a Presidenta, protagonista do noticiário e vídeos jocosos sobre o Brasil, que circulam pelo PALCO DO MUNDO. 
(Observação: Nada a ver com a crônica a seguir. Apenas quis desopilar o fígado.)


 
Introdução


Trabalhando muitos anos na região do Jardim Paulista em São Paulo, tive a oportunidade de me divertir observando alguns anônimos personagens que viviam por ali, muitos dos quais com certeza dariam estórias muito engraçadas. Alguns desses personagens aparecem em uma crônica que escrevi em  2001, relatando cenas engraçadas ou tragicômicas que   achei interessante incluir neste capítulo para caracterizar os Personagens que se apresentam naquilo que chamamos O PALCO DAS RUAS.
Quanta coisa engraçada poderia sair da boca desses personagens anônimos que a cidade grande mostra para quem quiser ver e ouvir. Um desses, vale a pena dizer, um tipo bastante popular, O NO CEGO, caracteriza muita gente que apenas vê no “outro” esse personagem. Escrevi o "Nó Cego"  em maio de 2001. Veja se não era de você, de quem eu escrevia, meu caro leitor.
Essas duas crônicas mostram como podemos ver o dia-a-dia com uma boa dose de humor, bastando estar atento aos personagens que perambulam pela cidade
 
O PALCO DAS RUAS 




São Paulo não para. Trabalha também de noite e de madrugada. Quando amanhece o dia, como diz a vinheta de uma emissora de rádio, São Paulo apenas “acerta a posição”.
Amanhece. A cidade grande “acerta sua posição”. Hordas de trabalhadores correm para não perder a hora de chegar ao trabalho.
Nem olham quem caminha ao seu lado, parado no meio do caminho ou caído no chão.
Um apressado trabalhador tropeça em um bêbado sentado na calçada. Tentando se equilibrar, o coitado apoia suas mãos em um pedinte, indo ambos ao chão. O pedinte levanta-se rapidamente e o ajuda a se levantar, estendendo-lhe mãos sujas. 
O trabalhador anônimo se transformou por um instante, de um distraído espectador a figurante envolvido com dois personagens que o palco das ruas da cidade grande apresenta todo dia.
O bêbado e o pedinte eram apenas dois dos personagens dessa tragicomédia que os olhos agora atentos do trabalhador anônimo passaram a ver.
Viu o mendigo, sentado no banco da praça, dividindo com os pombos que arrulhavam barulhentos à sua volta, os restos de pão de seu desjejum matinal.
Viu a velha senhora com os restos de roupas que um dia certamente alegraram  sua dona, parando o trânsito da Consolação com um gesto elegante e decidido, para atravessar a rua com imponência. De saltos altos e guarda sol, às sete horas da manhã.

Viu e ouviu, o orador das esquinas  movimentadas da avenida Paulista, trazendo seu recado das esferas mais bem informadas da política, recusando qualquer oferta de rendição, do seu imaginário grupo guerrilheiro. Com sua rápida metralhadora verbal disparava, ã esquerda, ã direita e ao centro, por dois minutos, se tanto, e sumia na multidão.

Viu a escritora esfarrapada sentada nos degraus da passagem subterrânea sob a Consolação, escrevendo, imperturbável, no seu caderno roto e sujo. Com certeza ela conhecia as histórias desses personagens que até então ele nunca tinha reparado, e só ela saberia dizer, quantas outras histórias mais.
Nosso anônimo cidadão chegou a pensar que todos fossem atores mambembes participando de uma campanha para humanizar a cidade.

Imaginou também que esses  personagens seriam criados por ela, a escritora, naquele caderno onde estariam registradas inéditas falas daquele que alimentava os pombos, as gags proferidas pela velha senhora quando quase foi atropelada ao atravessar a avenida e as diatribes daquele orador da Avenida Paulista.

Era, ainda, uma época bem mais tranquila, sem a violência que a cidade agora sofre. Basta lembrar, por exemplo, que nessa época, um outro personagem, ficou conhecido por suas roupas e chapéu brancos, impecáveis, ao lado de um carro conversível, estacionado todas as tardes na ponta da Avenida Paulista onde passa a Consolação. Esse curioso personagem ficou registrado nas páginas de uma revista (ou jornal) que não me lembro. Se fosse hoje, teria também grande chance de ser notícia.  Notícia policial, vítima de assalto.
O caderno da escritora deve ter guardado para sempre a história de um personagem que circulava nas adjacências da região próxima da Paulista, Consolação e Angélica.
Nas páginas do seu caderno, acredito, a escritora não deve ter registrado que seu personagem cheirava mal e andava mal vestido. Como velhos companheiros das ruas, deve ter registrado que vestia um terno velho, mas elegante, e que era sempre muito educado com todos. Que pedia com educação e ganhava restos de comida nos restaurantes da região. Vi isto, mais de uma vez, naqueles tempos. Também deve ter registrado que seu personagem estava sempre de bem com a vida, que vivia cantarolando. Que não era violento.

Assim, cantarolando, o vi certa tarde, saindo da passagem subterrânea sob a Consolação, no lado da avenida Paulista. Caminhava descontraído e sem despertar a desconfiança de quem passava por ele, apesar do seu aspecto pouco sociável.  Olhou para dentro de um cesto de lixo, daqueles que ficam suspensos, e mostrou um grande sorriso. Esfregou as duas mãos na barra do paletó e com a mão direita tirou do bolso um guardanapo de papel. Com esse guardanapo pegou aquilo que foi o motivo do seu grande sorriso: um sanduíche mal aproveitado.

Antes de passar por mim, ainda o vi limpar o petisco e levantá-lo, como se estivesse agradecendo ao seu desconhecido benfeitor. Foi a última vez que o vi.

Certamente essa cena a escritora não viu e não escreveu. No dia seguinte ela não estava no seu lugar costumeiro. Desaparecera como tantos outros personagens do seu caderno, nada deixando de vestígios para aqueles que ainda vão chegar para o trabalho.

Outros atores dessa tragicomédia logo estarão nesse palco das ruas da cidade grande. É só querer ver. (JN – 31/01/01)





Um comentário:

  1. Oi Neves, seu e-mail aparece aqui para que outros leitores se identifiquem com a cidade de São Paulo, através de personagens como aqueles mencionei e que v. também reconheceu.

    Oi, Nagado




    Andei passeando um pouco pelo seu blog, e reli o seu "Nó Cego", e li pela primeira vez as estórias sobre personagens da cidade. Reconheci algumas, como o do cara elegante que posava ao lado do conversível, não na região da Paulista, mas junto ao Parque Ibirapuera. O outro era o homem de terno e gravata que vivia cantarolando, mas lá pelo Centro, na 24 de Maio e Barão.




    Acho que está na hora de você botar essas crônicas num livro. Com certeza, muita gente identificará essas figuras e se lembrará de outras que viu por aí.




    Abraço, e bom fim de semana

    Neves, obrigado!
    (Nagado 13.08.2015)


    JC - 04/07/15

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